Filomena Rodrigues tem 47 anos, é portadora de Esclerose Múltipla e utente do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (HFF). Foi diagnóstica com Esclerose Múltipla aos 27 anos de idade, tendo sido, até então, uma pessoa sempre saudável sem qualquer problema de saúde que denunciasse esta doença degenerativa.
Hoje partilhamos consigo o testemunho desta doença através da história desta utente. São afetados por esta doença cerca de 2.3 milhões de pessoas no mundo e mais de 8.000 pessoas em Portugal.
A Esclerose Múltipla (EM) é uma doença crónica, inflamatória, constituindo uma das doenças neurológicas mais degenerativas do Sistema Nervoso Central. Constitui a segunda causa mais frequente de incapacidade no adulto jovem, sendo as suas manifestações clínicas diversas e consoante a localização cerebral onde se encontram as lesões.
Essas manifestações incluem alterações visuais, da sensibilidade, força muscular, espasticidade, dor, desequilíbrio, disfunção urinária, intestinal e sexual, distúrbio da marcha, declínio cognitivo e fadiga. A evolução da doença é muito variável de doente para doente e impossível de prever.
Foi no dia 16 de setembro de 2001, já lá vão um pouco mais de 20 anos, que os profissionais de saúde do Serviço de Neurologia do HFF descobriram que Filomena Rodrigues era portadora de Esclerose Múltipla. No dia anterior, 15 de setembro, acordara para se preparar para trabalhar, mas algo estava diferente: tinha perdido a visão do olho direito.
Este episódio aconteceu poucos dias após o 11 de setembro, dia do ataque terrorista às Torres Gémeas, em Nova Iorque, nos Estados Unidos da América. Filomena, então com 27 anos, refere que emocionalmente este episódio dramático a afetou muitíssimo: os médicos referiram que este episódio, fortemente emocional e traumático, e vivido intensamente por Filomena, certamente terá provocado esta perda de visão, uma das consequências da Esclerose Múltipla.
Nas três noites seguintes ao 11 de setembro, perturbada por tudo aquilo que tinha acontecido, Filomena conta que não conseguia dormir. Só na noite de 14 para 15 de setembro é que conseguiu dormir e nessa manhã, como já se contou, acordou naquele estado.
Tentou perceber o que se passava, com a ajuda do marido. Estando um pouco confusa, desvalorizou a situação e pensou que tudo aquilo passaria durante o dia e decidiu seguir com o seu quotidiano e foi trabalhar.
O dia 15 de setembro era um sábado e ao final do dia, já depois do trabalho, Filomena tinha também um casamento, o casamento do filho da sua patroa e amiga, Odete. Quando chegou ao trabalho contou a sua situação a Odete e perguntou-lhe se se podia ausentar um pouco para se deslocar até ao optometrista, ali perto, na esperança que a conseguissem ajudar a perceber o que se passava.
Foi repreendida: não só não havia problema como não deveria sequer ter ido trabalhar, pois era importante ir ao hospital de forma a poderem avaliar o que se estava a passar. Mas Filomena recorda que se sentia perfeitamente bem, sem mais nenhum sintoma ou mal-estar, apenas continuava sem conseguir ver.
Filomena deslocou-se então ao optometrista onde não lhe conseguiram sequer medir a tensão ocular e recomendaram que o melhor seria deslocar-se até ao hospital para ser observada. Depois do trabalho foi para casa e apesar de o marido lhe ter dito que seria melhor não ir ao casamento e ir ao hospital, Filomena sentia-se bem e decidiu ir ao casamento.
Filomena recorda-se que cerca da meia-noite o olho direito ficou completamente colado, fechado. E foi nesse momento que Filomena teve noção realmente da gravidade da situação e decidiu dirigir-se ao serviço de urgência do HFF.
Tendo em conta que o serviço de urgência noturna de oftalmologia da área metropolitana de Lisboa estava localizado no Hospital de São José, Filomena dirigiu-se para este hospital de forma a ser avaliada a sua situação. Foi chamada à atenção pela equipa que a recebeu, pela demora em ter-se dirigido ao hospital após os sintomas.
As primeiras suspeitas apontavam para um tumor no cabeça. Mas, após realizada a TAC, nada foi detetado.
Filomena foi então na manhã seguinte transferida para o HFF, uma vez que é o Hospital da sua área de residência. Ficou internada no Serviço de Neurologia, onde foi sujeita aos mais diversos e complexos exames para identificar a causa de ter perdido a visão. Chegou-se então à conclusão de que Filomena sofria de EM e que tinha sido essa a causa da cegueira.
Desde então tem sido sempre seguida no HFF, três anos após ser diagnóstica com a doença voltou a ter alguns sintomas fortes, desta vez na vista esquerda, e esteve internada no HFF. Passaram-se vários anos sem nenhum sintoma da doença, sempre medicada e seguida pela Neurologia do HFF.
No entanto, nunca mais conseguiu recuperar a visão do olho direito. Há oito anos atrás voltou a ter mais sintomas graves da doença, que afetaram a sua função motora do lado direito e que originaram diversos internamentos no HFF.
Ainda assim, os tratamentos têm permitido que ao longo destes 20 anos a doença se tenha mantido relativamente controlada.
Dois anos após o diagnóstico engravidou da sua segunda filha (já era mãe de um menino com seis anos), mesmo estando a fazer os tratamentos a gravidez decorreu sem qualquer contrariedade. Durante a gestação foi sempre acompanhada no HFF, onde acabou por nascer a criança.
A doença obrigou à reforma por invalidez (com uma incapacidade de quase 70%). Lutou até ao fim contra este desfecho: não era essa a sua vontade, pois sempre foi uma pessoa muito ativa e trabalhadora.
Há seis anos que faz um tratamento inovador no Hospital de Dia Polivalente do HFF. Uma vez por mês, durante cerca de uma hora e meia, submete-se aos cuidados dos profissionais do HFF.
Não tem apresentado mais nenhum surto ou sintoma da doença, mantendo assim a doença controlada. Este tratamento veio possibilitar a Filomena uma vida menos centrada na doença, pois já não necessita de se submeter à medicação diária, nomeadamente as injeções que ela própria tinha de aplicar no seu corpo todos os dias.
“Tento encarar a doença com leveza para levar a vida para a frente. Na minha vinda mensal ao Hospital de Dia Polivalente do HFF, para fazer o tratamento, digo que venho ao Instituto de Beleza, é uma forma de suavizar a doença, nem todos os dias são fáceis, mas com boa disposição e pensamento positivo tudo fica suportável”, diz-nos.
Filomena, várias vezes durante esta conversa, recordou com emoção a equipa de profissionais de saúde da EM, equipa do Hospital de Dia Polivalente do HFF, os profissionais de saúde do serviço de urgência e do internamento do serviço de Neurologia. “São pessoas e profissionais fantásticos. O profissionalismo, a dedicação e o carinho com que tratam os doentes é inigualável.”, diz-nos esta utente. Refere ainda que “para mim muitos destes profissionais são como família e o HFF, para mim, é como uma segunda casa. Ajudaram-me a ultrapassar os momentos mais críticos da melhor forma possível, alguns deles já os conheço há 20 anos”.
Filomena recorda também a enfermeira-chefe do Hospital de Dia Polivalente do HFF, Helena Cardoso, e que também faz parte da equipa que acompanha a EM no Hospital. Há precisamente 20 anos atrás, quando Filomena foi diagnosticada com esta doença, Helena Cardoso – que era a enfermeira responsável do Serviço de Neurologia e tinha à sua responsabilidade os utentes afetados por esta doença – tem acompanhado esta utente. “Considero-a como família! Pois desde o primeiro minuto em que fui diagnosticada tem estado sempre ao seu lado, dando força, alento e motivação. Ensinou-me muito sobre esta doença, tem sido um apoio fundamental”.
Filomena mudou-se há cerca de dois anos para a Margem Sul e foi-lhe dada a possibilidade de ser seguida no Hospital da sua atual área de residência. Preferiu continuar a ser tratada e acompanhada no HFF, onde sente que os profissionais que a acompanham “são como família.”
“Apesar de serem os nossos cuidadores são praticamente 20 anos de amizades, já passei por muitos médicos, enfermeiros, auxiliares e administrativos, só tenho a dizer bem de todos. Quase todos os meses faço um bolo e trago aqui para os profissionais de saúde do Hospital de Dia do HFF, é uma forma de agradecimento por tudo aquilo que têm feito por mim.”, remata Filomena.
Filomena deixa uma mensagem final a todos quantos sofrem de EM: “não se deixem entregar à doença. Não deixem que a doença controle a vossa vida, sejam vocês próprios a controlar a doença e a fazer o vosso caminho. Os profissionais de saúde estão cá para nos ajudar, mas nós também temos de fazer a nossa parte!”.