Os Centros de Diagnóstico Pneumológicos (CDP) constituem-se como unidades de saúde diferenciadas para a Tuberculose (TB), podendo a sua atuação e localização física ser independente ou incluída em unidades de saúde primários. Os CDP prestam cuidados de saúde às populações, numa base diária ou em dias semanais fixos, apostando numa abordagem que inclui médicos/as de saúde pública, medicina geral e familiar, pneumologista (em alguns casos), enfermeiros/as especialistas em saúde pública, técnicos de saúde, administrativos/as, um conjunto de profissionais com formação e experiência na prevenção, protocolos de diagnóstico e tratamento da Tuberculose (TB).
Na área de influência da ULS Amadora/Sintra existem dois CDP: o da Amadora, localizado na Venda Nova e o de Sintra, em Mem-Martins. Nos dois concelhos, a prevalência da TB é elevada, o que leva a que estas equipas “de proximidade” adotem estratégias nacionais, sempre considerando as necessidades e perfil de doentes locais, com o objetivo de controlar e reduzir progressivamente os casos de doença.
O Centro de Diagnóstico Pneumológico da Amadora é composto por uma equipa multidisciplinar. Da parte médica: Maria Etelvina Calé, médica de Saúde Pública, coordenadora da mesma Unidade; Lúcia Soares e Joana Barbosa. Da equipa de enfermagem: Ana Bicho, Aldina Pinto e Daniela Monteiro. Isabel Cruz e Luís Ferreira são os Administrativos no CDP da Venda Nova.
A Unidade de Saúde Pública (USP) previne e controla a TB no concelho da Amadora, assumindo a responsabilidade de controlar a doença na comunidade, com vigilância epidemiológica (investigação e rastreio de contactos) e projetos de intervenção comunitária nos grupos vulneráveis. De acordo com a Enfermeira Ana Bicho: «O contributo da USP no controlo da TB no concelho da Amadora baseia-se na ação em três eixos principais: o/a utente diagnosticado/a com TB, realizando o inquérito epidemiológico, onde investiga fatores de risco, fonte de infeção e eventuais cadeias de transmissão (quem pode ter sido contagiado/a), identificando contactos de risco; os contactos de risco, efetuando o rastreio de TB, de acordo com as normas em vigor (inquérito de sintomas, RX tórax e IGRA); e a comunidade, junto da qual a USP desenvolve e implementa projetos de intervenção comunitária, dirigidos a grupos vulneráveis como migrantes, pessoas em situação de sem abrigo, de forma a prevenir a ocorrência de novos casos.»
Segundo a médica Lúcia Soares, os rastreios são: «uma das “portas de entrada de pessoas” aqui no CDP.» E prossegue: «Outra pode ser via doença ativa detetada, através de uma consulta hospitalar, após o registo pelos médicos/as, nos sistemas de vigilância como o SVIG-TB (Sistema de Vigilância da Tuberculose e o SINAVE (Sistema nacional de vigilância epidemiológica).»
A enfermeira Aldina Pinto é um dos rostos mais visíveis e assíduos junto dos/as doentes. Efetua ensinamento de toma de medicação, esclarecimento e apoio, no que tange as medidas de controlo de infeção, sobretudo quando se trata de casos de tuberculose bacilífera, quando estão contagiosas. Juntamente com a enfermeira Daniela, são o suporte de doentes na “tod”, (toma direta observada), em que doentes administram a terapêutica sob vigilância, e simultaneamente se podem identificar sinais e sintomas, daí decorrentes. A “tod” é decisiva, considerando o tempo (longo) de administração da terapêutica contra a tuberculose: entre os seis e por vezes mais que doze meses.
Atualmente, o CDP da Amadora segue 52 pessoas com TB (ativa) e 100 doentes com TB (latente, com infeção, mas sem manifestação de doença). Em regime de toma observada direta existe um total de 38 doentes naquele centro.
Considerando que o cumprimento da adesão à medicação é decisivo no sucesso do tratamento e pode conjugar-se com o retorno em segurança dos/as doentes à sua vida ativa, o CDP da Amadora introduziu uma inovação quando se trata de tod de doentes que reúnem condições clínicas e de cumprimento de terapêutica, previamente assegurados – a vídeo “tod”. Assim evita-se que doentes tenham de deslocar-se todos os dias à unidade presencialmente, permitindo que realizem a toma direta, monitorizada via vídeo, pela equipa de enfermagem. A experiência está a ser bem-sucedida e são já 9 as pessoas que aderiram ao regime de “vídeo tod”.
A colaboração com as associações da comunidade no CDP é uma realidade e a equipa colabora realizando formação com instituições que apoiam populações vulneráveis e migrantes como a AJPAS, Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes e associação Crescer.
A realidade do CDP Sintra
O Centro de Diagnóstico Pneumológico de Sintra abriu há cerca de um ano, a 1 de fevereiro de 2023. Marina Pinto Soares, médica coordenadora da Unidade de Saúde Pública e do CDP de Sintra sobre as vantagens deste centro: «Veio satisfazer as necessidades das pessoas do concelho de Sintra, em terem um CDP de proximidade. Antes, os/as doentes de Sintra iam sempre para o CDP da Venda Nova que é uma distância grande, sobretudo para os/as da zona oriental. Nos rastreios, sentíamos dificuldade em termos as pessoas, porque não tínhamos um sítio propriamente para consulta. Pedíamos raio x, pedíamos um IGRA para irem fazer ao Ricardo Jorge, INSA, em Lisboa e constatávamos que a maior parte dos/as doentes não fazia o rastreio. E foi quando descobrimos este espaço que não estava a ser utilizado. Próximo de transportes e com apoio da Câmara Municipal, conseguimos passar a ter uma consulta de rastreio, uma consulta de Pneumologia, consulta de medicina geral e familiar e de enfermagem. Temos aqui uma articulação, tanto da saúde pública, com mais facilidade e acesso para os/as utentes, para fazerem os respetivos rastreios e começámos logo a fazer aqui o IGRA, ou seja não mandar os/as doentes para Lisboa. Fruto de um protocolo com o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge que nos fornece os kits para fazer a colheita das análises. » «O/a doente quando vem para o rastreio, já leva a requisição do raio x tórax que pode fazer aqui em qualquer local convencionado e o IGRA que faz aqui logo. Este sistema ajuda na adesão ao rastreio e ajuda a prevenir a doença, da parte da saúde pública. »
O CDP de Sintra conta também com as médicas Inês Luz, pneumologista do Hospital Fernando Fonseca, a colaborar também nesta unidade, a médica de Medicina Geral e Familiar, Maria da Paz Brito, a Enfermeira especialista em Saúde Pública e dedicada ao CDP, Lúcia Alves, bem como as administrativas: Conceição Guerreiro e Lurdes Rodrigues.
Inês Luz é a médica pneumologista do Hospital Fernando Fonseca, destacada para o CDP de Sintra. «Quando os/as doentes chegam aqui, o ideal é virem referenciados/as pelo médico/a de família, após utilização do documento de referenciação que o médico/a de família utiliza, ou referenciados/as pelo hospital, pela urgência ou pelas várias especialidades. Ainda podem ser referenciados/as pela saúde pública, no caso dos/as doentes que fazem rastreios ou ainda por médicos/as do sistema privado.
Tuberculose latente e tuberculose doença – distinguir é fundamental
Segundo Inês Luz, «Estamos perante Tuberculose ativa quando há doença por tuberculose, existindo uma alteração objetivável ou seja a tuberculose pulmonar que é o mais frequente em que há sintomas, os sintomas típicos da tuberculose. Até há uma mnemónica que é muito fácil para as pessoas também estarem alerta, que se designa por: “FESTA” para os sintomas: febre, expetoração, tosse, a astenia (cansaço) e sudorese noturna. Estes são os sintomas da forma de tuberculose mais frequente que é tuberculose pulmonar.
«Mas há doentes que apenas estão a fazer uma investigação de um outro sintoma e que se descobre terem tuberculose.» «Costumo dizer que a tuberculose pode afetar qualquer órgão, ou parte do corpo, exceto as unhas.»
Inês Luz identifica tuberculose latente «quando há uma marca imunológica da presença, o nosso organismo reconhece o bacilo da tuberculose ou se a pessoa já teve contacto alguma vez na vida, e o organismo reconhece que aquela bactéria, está presente, mas está “adormecida”, grosso modo.
Educar e desmistificar são as palavras de “ordem”
No caso da TB latente, devem fazer tratamento apenas as pessoas que são imuno suprimidas, os/as profissionais de saúde que lidam com pessoas de risco ou os contactos com pessoas com TB, sobretudo no primeiro ano, período durante o qual têm um risco aumentado de desenvolver a doença.
«Às vezes até os meus colegas médicos s que pediram um exame IGRA que também não está indicado para toda a gente, dá positivo e mandam para o CDP para tratamento e nós não temos indicação para tratar.»
Para Marina Pinto Soares: «Em termos de saúde pública o que nos preocupa mais é o caso da tuberculose pulmonar bacilífera porque transmite a doença. Por exemplo, uma tuberculose óssea não transmite, tem de ser tratada, obviamente, mas em termos de saúde pública, a tuberculose pulmonar e a tuberculose laríngea também são as duas formas em que se verifica a aerossolização de partículas e havendo bacilos suspensos no ar, há risco de a pessoa vir a desenvolver a doença.»
Atualmente, o CDP de Sintra acompanha cerca de 100 doentes com TB doença e cerca de 300 doentes com TB latente. No total, esta unidade realizou em 2023 cerca de 3000 mil consultas médicas.
Enfermeira Lúcia Alves, dedicada ao CDP de Sintra, realiza consulta de enfermagem, na sequência de uma consulta de rastreio de contactos de pessoa com tuberculose na qual se fazem ensinos e quase sempre colheita de sangue para IGRA. «São muito poucos os utentes que vêm ao CDP à consulta de rastreio de contactos, que não vão à consulta de enfermagem. A Enfermeira Lúcia realiza consulta na sequência das consultas médicas de pneumologia, em que, além dos ensinos relativamente à situação de saúde, ensina sobre prevenção de contaminação, porque muitas vezes os/as utentes não cumprem os isolamentos de contacto que são necessários, sobre alimentação, distribui medicação gratuita. Segundo Lúcia Alves: «Há evolução na literacia relativamente à TB e à toma da medicação.» «Contudo ainda há muito stress das pessoas quando sabem que têm um IGRA positivo. Às vezes recebo telefonemas de pessoas em pânico. Porque acham que essa situação corresponde a doença ativa e não é.» A grande preocupação é sempre a família…porque podem contaminar.
Na primeira consulta há muita informação para apreender. Saem da consulta médica eu pergunto: «Dúvidas?» Não têm dúvidas. Mas depois quando questionados, não sabem dar informação. Quando pergunto que medicação e quando vão fazer análises, não retiveram da consulta médica. «A dra disse que era a senhora enfermeira que iria ensinar!».
É também nestas consultas de enfermagem que se faz o teste de mantoux, aos utentes que estão em tratamento imunossupressor ou que vão iniciar esse tratamento e que inclui também o teste de IGRA.
Outro aspeto valorizado pela médica pneumologista Inês Luz é colaboração com a medicina geral e familiar: «No CDP de Sintra, também trabalho com uma colega de medicina geral e familiar e acaba por ser importante porque muitas vezes os doentes não têm acesso a cuidados de saúde, não estão inscritos em nenhum centro de saúde e têm diversas patologias: diabetes, hipertensão arterial. É muito positivo trabalhar com esta colega que tem uma visão holística da doença enquanto médica generalista. Temos essa flexibilidade e que eu acho que resulta bastante bem. A nossa enfermeira é também excecional sempre presente e tem tido um ótimo papel na articulação com os cuidados de saúde primários e saúde pública.»
Por último, e não menos importante neste percurso de proximidade, destaca-se o Serviço de Saúde Ocupacional (SSO) da ULS Amadora/Sintra colabora no combate e erradicação da TB, intervindo a nível institucional, através da vigilância de saúde dos/as trabalhadores/as. Nos exames de saúde de admissão, e sempre que for oportuno, é realizada a identificação precoce dos/as profissionais infetados/as, utilizando a avaliação Interferon Gama Release Assay (IGRA). Em caso de surtos nosocomiais são identificados/as os/as profissionais em risco, realizando-se o rastreio que incluí a exclusão de doença ativa e infeção latente. Sempre que se justificar é feito o encaminhamento ao Centro de Diagnostico Pneumológico (CDP) para eventual tratamento e seguimento.
O diagnóstico e tratamento atempado e adequado de doentes, o reconhecimento precoce dos/das profissionais de saúde infetados/as e a adoção de medidas de proteção eficazes, são fundamentais para reduzir o risco de tuberculose entre os/as profissionais de saúde.